As Fortalezas do Rio Grande do Norte: Fortim de São José

Por Prof. Dr. Lenin Campos Soares


Em janeiro, o Forte dos Reis Magos faz aniversário, e apesar de ser o exemplo de arquitetura militar portuguesa mais bem preservado de nosso estado, ele não foi o único. Existiram no Rio Grande do Norte pelo menos seis fortins (São José, Redinha, Ponta Negra, Pirangi, Pititinga, Touros e Manoel Gonçalves) e três casas fortes (Ferreiro Torto, Pium e Cuó).

No Brasil, essas fortificações começaram a ser instaladas após a chegada do governo geral à Bahia, em 1549, e elas tinham inicial objetivo, como diz Roberto Airon Silva, proteger a posse do território de invasores, especialmente franceses, e de servir de base para expansão da colonização, especialmente em regiões fronteiriças como era o Rio Grande até o século XVIII. Sua construção era de responsabilidade da própria Coroa, representado pelo capitão-mor ou pelo governador geral, juntar dinheiro (a documentação fala “com seus próprios recursos e gentes”).

“O sistema defensivo instalado nas cidades e povoações litorâneas da colônia primava pelo sistema de defesa passiva, apesar de ter um pouco de defesa ativa, pois este sistema estava assentado no posicionamento estratégico das fortificações nas desembocaduras dos principais rios, baías, nos istmos e no próprio solo urbano. A base construtiva dessas fortificações era uma edificação capaz de suportar ataques vindos de frotas navais, além de ao dispor de baterias de pequeno, médio e grande porte poderia exercer a defesa ativa no controle dos portos” (SILVA, Roberto. p. 142).

Contudo, no caso do Fortim de São José, na praia de Genipabu, seu contexto de construção é outro. Levantado já no século XIX (ele é concluído em 9 de abril de 1808), Genipabu participa da preparação de uma guerra contra o império napoleônico. O rei de Portugal, D. João VI já esperava uma invasão do novo imperador francês quando ficou do lado da Inglaterra, seu aliado secular. Então ela organizou a sua defesa antecipadamente. A coroa portuguesa solicitou ao governador da capitania, o tenente-coronel José Francisco de Paula Cavalcanti de Albuquerque que informasse aonde convinha melhorar a defesa daquela capitania. A resposta foi dada no “Memorial Relativo à Defesa da Capitania do Rio Grande do Norte” enviado ao rei. Nesse texto, diz o governador:

“Primeiro fortificar-se a enseada da Ponta Negra, fazendo-se-lhe uma fortaleza, ou ao menos uma bateria com peças de grosso calibre, que varra toda a dita enseada, principalmente a meia légua, que oferece bom desembarque ao inimigo (…). Segundo, fazer-se outra fortaleza na margem do rio, no lugar denominado Redinha, que cruzando com a da da barra, defenda a entrada della; (…). Terceiro, fazer-se na enseada do Genipabu um forte, e uma trincheira, para disputar o desembarque ao inimigo (…). Quarto, fazer-se na enseada de Pititinga outro forte e trincheira que façam respeitável aquela baía, onde continuamente vão parar embarcações estrangeiras, que acossadas do tempo procuram abrigar-se”.

Em todos, o governador afirma que as fortificações já estão prontas, porém como “as circunstâncias permitiram”. Afirma Câmara Cascudo que o aparelho militar foi construído por escravos cedidos pela própria população, convocada pelo governador. O historiador descreve um “entusiasmo coletivo” entre aqueles que doaram os escravos ou alimento para sustentá-los durante a ereção do fortim. “Mandavam farinha, carne e peixe para os escravos (…). O governador apenas fornecia farinha quando acabava a previsão presenteada. Era toda a despesa do Real Erário”. O governador então pede ao rei maiores condições de melhorar estas construções. Pede peças de artilharia e munições, além de homens. E reclama da falta de atenção dada pelo seu superior, o capitão-geral que ficava em Pernambuco.

Segundo Vicente de Lemos, o primeiro comandante do fortim se chamava José Xavier de Mendonça, oriundo da Artilharia do Regimento de Olinda e, por dois anos, tinha sob seu comando cem homens. O prédio é descrito como possuindo uma guarita de madeira, sobre uma muralha de pedras e uma casa de aguada (um espécie de poço). O fortim ficava entre as atuais praias de Santa Rita e Genipabu.

Localização do Fortim de São José.

Após a independência, em 1822, e do retorno de D. Pedro I para Portugal, os regentes acreditaram que a manutenção dos fortins brasileiros era uma despesa que não cabia mais no orçamento imperial. Em 16 de novembro de 1831 foi então aprovado o novo orçamento que excluía a manutenção destes aparelhos militares. Cabia, no entanto, a decisão aos presidentes de província. No Rio Grande do Norte, os fortins foram então fechados. Retirada a guarnição, sem manutenção, as paredes desmoronaram lentamente.
Hoje apenas alguns pedaços do alicerce do fortim nos dão alguma ideia do seu tamanho, como na foto abaixo:

Na foto, vemos os pontos mais grossos que são os restos de alicerce que ainda existem na praia. Nos dando ideia do formato do fortim. Vejamos abaixo mais fotos:

Foto da década de 1980

Abaixo temos fotos atuais do local. A região é sempre invadida pelas águas do oceano por isso os resquícios dos alicerces estão cada vez menores, fruto do natural desgaste que o impacto das ondas causa nas pedras. No entanto, buggys e carros de passeio costumam também trafegar no local, causando um impacto desnecessário ao que deveria fazer parte do nosso patrimônio arqueológico. O sítio, infelizmente, não é tombado.


Para Saber Mais:

Augusto Fausto de Souza. Fortificações no Brasil.

Edison Cruxen. A arquitetura militar portuguesa no período de expansão ultramarina e suas origens medievais.

José Francisco de Paula Cavalcanti de Albuquerque. Memória relativa à defesa da capitania do Rio Grande do Norte.

Luís da Câmara Cascudo. Acta Diurna: Fortim de São José de Genipabu. IN: Diário de Natal, 09 de outubro de 1947.

Roberto Airon Silva. Uma arqueologia das casas fortes: organização militar, território e guerra na capitania do Rio Grande - século XVII.