História da Arte Potiguar: Arquitetura Barroca
Por Prof. Ítalo Douglas dos Santos Silva
Prof. Dr. Lenin Campos Soares
A arte barroca advêm de um contexto muito singular da Europa e que com o tempo foi se espalhando pelos países católicos principalmente os ibéricos, Portugal e Espanha. Surgido primeiramente no século XVII, na Itália, ela se configura como uma das principais manifestações artísticas da Contrarreforma católica, tentando combater com a expansão protestante no mundo. De maneira geral, a Arte Barroca adentrou nas pinturas, esculturas e arquitetura e por ser um movimento ligado diretamente ao cristianismo católico, as suas principais expressões encontram-se dentro de seus templos.
A primeira fase do Barroco português, que vai de 1600 até 1730, é chamada de Barroco Nacional Português, ela é caracterizada por um período de suntuosidade, exuberância, grande riqueza e esplendor. A segunda fase, de 1730 até 1760 é chamada de Barroco Dom João V, cujo estilo é mais pesado, usando menos curvas e utilizando mais linhas retas (muitos quadrados e retângulos), ainda existe exuberância e suntuosidade, mas com menor intensidade que no período anterior, uma característica interessante é que a decoração costuma ser sempre simétrica. A terceira fase, a partir de 1760, é chamada de Rococó. Neste os elementos ocorrem em menor quantidade, aumentando os espaços vazios nas paredes.
Com o advento do Barroco, as igrejas começaram a ter mais ornamentos, uma decoração extravagante sempre exaltando a grandiosidade e o poder divinos. Além disso fica presente, em sua arquitetura, o forte uso de espaços e formas ovais, uso de arcos, colunas tortas e fachadas convexas e côncavas, que contribuem para uma ideia de movimento. Apesar de serem características marcantes, esses aspectos variam dependendo do país e da região.
No Brasil, o Barroco teve início somente no século XVIII, quando na Europa ele já perdia força, e teve destaque em cidades como Recife e Olinda, na capitania de Pernambuco; e em Ouro Preto e Mariana, na capitania de Minas Gerais, os especialistas acreditam inclusive que nestes dois polos temos Barrocos completamente diferentes, que o Barroco mineiro é completamente diferente do Barroco nordestino. Porém, apesar de ter muito menos luxo e pompa, em estados e cidades com uma elite menos rica este estilo também deixou registros.
Em terras potiguares, na capitania de Rio Grande, uma dessas regiões em que o barroco se desenvolveu de forma menos extravagante por causa do menor poder econômico da elite, ainda hoje sobrevivem alguns exemplos da influência desse movimento artístico em Natal, porém graças a falta de conservação, perdemos alguns exemplares magníficos como a Igreja de São Miguel em Extremoz.
A Igreja que hoje se encontra em ruínas era considerada “o mais belo templo da capitania”. Cascudo afirma que em 1755 ela estava pronta e possuía 16 metros de altura, por 13 metros de largura e 30 metros de comprimento, só seu frontão chegava a 3,5 metros. Suas paredes possuíam impressionantes 80 centimentros de espessura. As portas da atual Capela de São Miguel eram as antigas janelas da igreja (uma curiosidade é que a pia batismal da atual capela é original da igreja barroca). Ela começa a ser levantada em 1607, quando os jesuítas se instalam na região da Lagoa do Guajiru, com o aldeamento indígena Extremoz se tornou rapidamente um importante centro pecuarista, a região enriqueceu, se tornando a segunda vila do Estado em 1760. Porém, com a expulsão dos jesuítas do Brasil (que deixaram o convento que habitavam ao lado da Igreja) e o crescimento dos engenhos em Ceará-Mirim, o deslocamento do centro econômico acabou fazendo com que a população migrasse para a nova cidade, abandonando o belíssimo templo ao esquecimento ainda em 1897. Os últimos registros da igreja de pé são do início do século XX.
“Há curiosas estórias, que se contam de tesouros fabulosos acumulados pelos discípulos de Loyola, e que teriam sido enterrados em tortuosas galerias cavadas nos alicerces dos seus edifícios, cujas entradas, cavaram-se verdadeiros túneis nos terrenos dos dois edifícios, em busca dos hipotéticos tesouros. Afinal, dado o insucesso das buscas fatigados e desiludidos, os exploradores abandonaram a empreitada, deixando verdadeiras crateras, que foram enfraquecendo cada vez mais as paredes desprotegidas” (SOUZA, 2019)
Porque achavam que havia tesouros na Igreja? Porque ela possuía imagens riquíssimas, esplendores de prata e ouro, terços com pedras preciosas, objetos de culto reluzentes, é bem provável que ela possuísse outro em alguns dos altares também (como o barroco pernambucano). As imagens de santos ainda reapareceram durante o século XX, criando as lendas dos Santos Aparecidos de Extremoz, nada mais do que os tesouros roubados de São Miguel.
Dos monumentos barrocos que nos restaram a Igreja de Santo Antônio, popularmente chamada de Igreja do Galo, é provavelmente a mais rica em elementos tradicionais do Barroco. Fundada em meados de 1766, é a igreja possuí, na parte externa, o frontão adornado, a torre única, os pináculos e as volutas em suas paredes, e na parte de dentro encontra-se um altar principal coberto de madeira esculpida tudo isso dividido em um conjunto arquitetônico formado pelo corpo central, ala lateral e a torre quadrangular. Apesar desses traços remeterem o barroco clássico, também se faz presentes atributos do que ficou conhecido como Barroco Tardio, que pode ser identificado pelo maior uso de espaços vazios entre as decorações e na sua constituição, como é o exemplo dos dois altares laterais em madeira junto a um outro altar no centro, com um amplo espaço vazio entre eles, o que deixa a igreja sem a sensação de tensão e opressão característica da arquitetura barroca clássica.
Apesar de ser a igreja mais reconhecida quando se fala do Barroco potiguar, outras igrejas também sofreram a influência desse estilo arquitetônico, porém em menor grau. Um exemplo é a Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, fundada no fim do século XVIII, apesar das influências advindas do Barroco se diferencia e muito da Igreja de Santo Antônio. Primeiramente sua fundação se dá por uma irmandade de negros, a irmandade Nossa Senhora do Rosário dos Preto. Portanto servindo como o espaços de liturgias para uma classe mais desfavorecida da sociedade, como os escravos e ex-escravos e pessoas pobres num espectro mais abrangente. A origem humilde dos frequentadores também reflete na estrutura da igreja que apresenta uma maior simplicidade, traços mais retos e poucos ornamentos. Contudo o frontão com curvas e volutas ainda se faz presente apesar de não ser tão trabalhado. Essa maior simplicidade da igreja faz com que seu estilo se aproxime mais do Rococó, um outro estilo de origem francesa, que surgiu como um desdobramento do Barroco.
Vale destacar também igrejas mais distantes da capital como a Igreja de Nossa Senhora do Rosário no município de Acari e a Igreja de Nossa Senhora do Ó em Nísia Floresta ambas fundadas perto do fim do século XVIII e apesar de mais modestas também apresentam uma ou outra característica barroca em suas feições, seja um pouco mais de ornamentos ou um frontão mais detalhado. Em Acari, a igreja, inicialmente uma capela de Nossa Senhora da Guia possuí o frontispício, com cornija e frontão alteados, e vergas em arco abatido, tudo uma simplificação do estilo barroco. No interior, no entanto, destaca-se o altar-mor com madeira policromada e aplicações em ouro no retábulo e no arco do cruzeiro. Já em Nísia Floresta iniciou a construção de sua matriz em 1703 e é concluída em 1755, sua fachada já foi construída como neoclássica, porém os altares interiores são Rococó, em madeira e aplicações douradas.
Apesar das diferenças entre as construções mencionadas, os templos potiguares também nutrem, uma diferença grande com as igrejas de Recife, de quem sofria mais influência devido a proximidade, nem de longe a Igreja de Santo Antônio, a mais barroca entre as suas conterrâneas, chegou a ter o brilho dourado do ouro em sua estrutura, isso reflete tanto os entraves financeiros da capitania como também o tipo de barroco empregado em solo potiguar. Nosso barroco é uma simplificação do estilo, e alguns historiadores vão argumentar que isso se dá por causa da centralização econômica que se dava em Recife e Olinda.
Para Saber Mais:
Câmara Cascudo. História da Cidade do Natal.
Augusto Teles. Brasil: arquitetura religiosa barroca.
Extremoz guarda a memória da História do RN e da Igreja Católica
John Bury. Arquitetura e arte no Brasil colonial.
Juliano Carvalho. Igreja de Nossa Senhora do Rosário - Acari
Oswaldo Câmara de Souza. Acervo do patrimônio histórico e artístico do Rio Grande do Norte.